Pois bem... O lendário Guia Michelin foi publicado pela primeira vez em 1900 por André Michelin e seu irmão Edouard, fundadores da Compagnie Générale des Établissements Michelin, a famosa empresa fabricante de pneus. A primeira edição do guia tinha foco meramente publicitário, motivado pela Exposição Universal de 1900. Nessa época o Guia Michelin era um brinde que os clientes recebiam na compra dos pneus Michelin. Na virada do século XX a França contava com pouco mais de 2.400 motoristas, para os quais o guia trazia informações como endereços de oficinas, postos de gasolina, farmácias, médicos, mapas e curiosidades.
Até 1908 o guia passou a servir principalmente para a divulgação de hotéis e oficinas mecânicas. No ano seguinte a Michelin optou pela supressão total da publicidade paga no guia visando tornar-se mais independente e conquistar maior credibilidade de seus leitores.
Foi só a partir de 1920 que o guia deixou de ser oferecido como brinde e passou a ser vendido. Comenta-se que certa vez André Michelin, ao passar por uma garagem, ficou aborrecido ao ver o eixo de um carro sendo calçado por uma pilha de Guias Michelin. Para que o guia não fosse tratado com banalidade, ele decide trabalhar melhor o seu conteúdo e a cobrar por ele. Foi então que surgiram no guia a avaliação de restaurantes realizada pelos criteriosos inspetores anônimos da Michelin.
Exemplar do Guia Michelin de 1960: o número de páginas já era próximo do que temos nas edições mais atuais.
Se de um lado a idéia era nobre, de outro tais mudanças não agradaram os leitores - poucos mostraram interesse em pagar pelo guia que estavam acostumados a receber de graça. Como estratégia para valorizar a imagem do guia e a desencalhar as edições já impressas, a Michelin os distribuiu nas escolas como uma recompensa aos melhores alunos. E a idéia deu certo, já que os pais desses alunos tão aplicados também passaram a conhecer o novo Guia Michelin. A partir do ano seguinte, portanto, o Guia Michelin tornou-se um sucesso de vendas.
O maior do mundo: O chef Paul Bocuse (de paletó azul) é o recordista de permanência com 3 'estrelas' no Guia Michelin. Seu restaurante Collonges-au-Mont-d’Or ostenta todos os seus 3 macarons desde 1965. Foto: Auberge des 3 Canards, Ognon, França (2004).
Em 1926 surgem os macarons para designar os melhores restaurantes e em 1931 a classificação em 1, 2 e 3 macarons. 1926 foi também o ano da criação do Guia Regional Michelin - o guia turístico que deu origem aos atuais guias de capa verde. Apesar de ser um termo amplamente mencionado pelas pessoas, as tão famosas 'estrelas' dos restaurantes classificados pelo Guia Michelin na realidade não existem. Até hoje o guia atribui às boas mesas os macarons, que nada têm a ver com as estrelas - usadas no guia para a classificação de hotéis.
Exceto pela edição de 1921, o Guia Michelin não foi editado durante as duas grandes guerras. Em 1944, em plena Segunda Guerra Mundial, a direção de Michelin em Paris decide imprimir em Washington uma reprodução da última edição do guia lançada antes da guerra - a de 1939. A empresa pede então que o Estado Maior das Forças Aliadas distribua o guia a cada soldado americano que fosse desembarcar na Normandia, já que o guia continha centenas de mapas detalhados e atualizados das cidades francesas. Esses mapas foram extremamente úteis aos soldados aliados para a desocupação das cidades de Bayeux, Cherbourg e Caen.
A chef Anne-Sophie Pic é a única mulher do mundo a conquistar 3 macarons no Guia Michelin.
Editado em 22 países, o 'Guide Rouge' da Michelin já vendeu vendeu mais de 30 milhões de exemplares desde sua criação. E é justamente as cores das capas que nos fazem reconhecê-lo de longe nas livrarias segundo a especialidade: capa vermelha para o guia de hotéis e restaurantes e capa verde para os guias de viagem. Impresso sempre no mais absoluto sigilo, nem mesmo o número dos exemplares de tiragem é divulgado - estima-se que sejam impressos em torno de 500.000 por ano. O mítico guia vermelho é dedicado aos seguintes países: França, Bélgica, Holanda, Itália, Alemanha, Espanha, Portugal, Suíça, Grã Bretanha e Irlanda, além de uma edição-coletânea dedicada às principais cidades da Europa. Em 2006 foi lançada uma edição específica para a cidade de New York e em 2008 outras duas novidades: edições de Tokio e Hong Kong.
A atribuição anual dos macarons (estrelas) é aguardada com ansiedade pelos grandes chefs. Se o recebimento de um macaron pode ser a glória para alguns o não recebimento de um aguardado macaron resulta em grande decepção ou mesmo em tragédia, como a que aconteceu em 2003, quando o chef francês Bernard Loiseau cometeu suicídio ao se desesperar com rumores de que seu restaurante perderia uma de suas três 'estrelas' no Guia Michelin. O sobe e desce da classificação de restaurantes no guia costuma promover discussões acaloradas na mídia especializada e não é raro acontecer alguma reação pontual curiosa: seja um crítico reclamando que certo restaurante foi injustiçado, um chef que se recusa a receber o macaron, um chef surtando de raiva enquanto outro exibe exageradamente suas 'estrelas' ou mesmo um restaurante até então ignorado pelo público se tornar a sensação do momento por conta de um macaron recebido.
O chef Eric Fréchon do restaurante Bristol de Paris foi o único este ano a se juntar ao seleto grupo dos 'chefs 3 macarons' - além dessa honraria, o chef Fréchon já havia sido agraciado com o título de Melhor Trabalhador de França em 1993 e recebido das mãos do presidente Nicolas Sarkozy no ano passado a medalha de Cavaleiro da Legião de Honra.
Além dos famosos guias verde e vermelho a Michelin ainda edita desde 1997 o guia Bib Gourmand, que classifica os restaurantes de boa mesa a preços modestos (um verdadeiro manual de sobrevivência para quem não tem o cacife à altura do bom gosto) e desde 2003 um guia dedicado a roteiros de charme e outro sobre lojas e restaurantes de cozinha regional francesa. Existem ainda mapas rodoviarios, guias menores sobre temas específicos e mais recentemente a revista bimestral étoile, com notícias e atualidades sobre as cozinhas mencionadas no mais famoso guia gastronômico do mundo.
Para saber mais acesse a página oficial da Centésima Edição do Guia Michelin ou ainda o site da étoile, a recém lançada revista bimestral do Guia Michelin (nas bancas por 4,90€). Para conhecer a historia do bonequinho da Michelin, clique em Bibendum: o bonequinho da Michelin.
Artigo sugerido pelo leitor Edu Rocha. Fontes: Sites oficiais do grupo Michelin, jornal Le Figaro, jornal Direct Soir e revista étoile, le magazine du Guide Michelin.
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